01 dezembro 2009

O Natal de S. Jerónimo

O Natal não era bem-vindo em São Jerónimo de Belmonte. Ninguém gostava do Natal por aquelas bandas. Ali, o Natal era sinónimo de medo e causa de grande inquietação. Sempre que o Natal chegava coisas ruins aconteciam: roubos, mortes e um conjunto de outras desgraças.
Aquela cidade encarava o Natal como uma espécie de maldição. Uma factura a pagar por erros antigos, cometidos por pessoas sem escrúpulos, que condenaram a cidade a viver aquele suplício. As pessoas gostariam de esquecer o Natal, m
as isso era impossível.
Nas cidades vizinhas o Natal era normal e as pessoas mantinham as preocupações rotineiras do dia-a-dia, sem grandes temores. Eles conhecia
m os efeitos do Natal em S. Jerónimo; conheciam a história daquela cidade e sabiam o porquê da maldição envolvendo o Natal mas, como bons católicos que eram e como não era nada com eles, aceitavam-na.

Notava-se uma crescente ansiedade e angústia em todas as gentes à medida que aquela altura do ano se aproximava. Às vésperas da chegada do Natal já ninguém falava com ninguém, não havia sorrisos nas caras das pessoas e o comércio pouco se preocupava com as vendas. O Natal estava à porta e o povo pensava em c
omo se proteger e conjecturava sobre o que de mal poderia acontecer este ano.
A cidade encontrava-se em reboliço e o movimento era frenético nas ruas. Algumas pessoas compravam pregos e tábuas para fixarem portas e janelas, outras faziam as malas e partiam nos seus carros.
Havia uma grande debandada da população e a cidade ficava praticamente vazia. Em determinados anos a cidade ficava sem qualquer pessoa e a única coisa que se ouvia eram os ventos fortes e frios das noites de Dezembro.
A cidade preparava-se novamente para enfrentar a sua maldição.

Naquela noite não estava ninguém na rua. Raramente, via-se um carro na avenida principal a dirigir-se para fora da cidade. As luzes das ruas permitiam ver as poucas decorações de Natal preparadas pela câmara municipal.
As casas mantinham portas e janelas encerradas e as pessoas, que se mantinham corajosamente na cidade, protegiam-se do que viesse a acontecer. Os moradores conseguiam ver luzes azuis e vermelhas que penetravam nas frestas das janelas que imaginaram ser dos pirilampos das viaturas da polícia.
De repente o silêncio foi quebrado. Ouviram-se gritos, sirenes e, finalme
nte, uma saraivada de tiros. Ouviam-se vidros a partir e pessoas a correr. Vozes de comando indicavam as posições dos polícias no terreno. Ouviam-se o zunir das balas que seguiam o seu caminho. Viam-se flashs e cheirava-se o medo. O Natal chegara para cumprir com a tradição.

E fez-se silêncio novamente. Tão depressa como começou, terminou. Ouviam-se agora gritos de alegria e gargalhadas e as pessoas comemoravam.
A maldição terminara, finalmente.

Na manhã seguinte, os ardinas gritavam a principal notícia do jornal da cida
de. As pessoas beliscavam-se mutuamente numa tentativa de descobrir se tudo não seria um sonho.
No jornal podia-se ler:




Luís Fernandes Lisboa ®

(Para fazer a vossa própria "notícia" vão a este site)
Para a Fábrica de Letras:

14 comentários:

Demian disse...

Está bom.

Também me convidaram a participar nisso, mas ainda não arranjei paxorra... Já para actualizar os meus blogs me vejo grego, quanto mais para escrever para eles. Não sei se aceitam textos já publicados, tenho um ou outro mais antigos que até não estão maus, mas também tenho preguiça de ir perguntar. Isto do comodismo é mais contagioso que a gripe A! xD

Sahaisis disse...

powerfull:P

Johnny disse...

Muito bom.

Brown Eyes disse...

Morreu o Natal? Já não era sem tempo ahahah. Muito imaginativo.

Eva Gonçalves disse...

Not bad :) Not bad at all!

Catsone disse...

Grave, podes participar com textos já publicados desde que respeitem o tema mensal, neste mês, por exemplo, é o "natal".

Sahaisis, do you think?

Johnny, gracias.

Brown eyes, cada um mata o natal como quer ;)

Eva, tks.

El Matador disse...

Bem caçado.

Teresa Diniz disse...

Muito interessante, esta ideia de virar o Natal ao contrário e torná-lo uma maldição. Gostei!

João Roque disse...

Olá
retribuindo a tua visita e dando-te os parabéns pela originalidade desta história.
Aliás o blog, no seu todo agrada-me bastante e vais-me "sentir" por aqui de vez em quando.
Abraço.

Catsone disse...

Teresa, seja bem.vinda e obrigado.

Pinguim, bem-vindo. A porta da tasca está sempre escancarada. :D

Ginger disse...

AH AH AH

Confesso que fui lendo o texto com uma ansiedade e curiosidade crescentes. =p

Mas que twist final! =D

Muito bom! =D

Unknown disse...

E foi nisso mesmo que transformámos o Natal..numa maldição. Extremamente original a ideia!

Catsone disse...

Luís, é a "maldição dos preços baixos" ;)
Obrigado.

Sena do Aragão disse...

Gostei!

Consegui ter duas impressões de um mesmo texto.

A primeira me fez pensar em como as pessoas se comportariam nessa época frente a violência nas cidades. Até por que, alguns constumam comemorar nas ruas até mais tarde, e isso as vezes é perigoso.

Depois fui levado a imaginar o alívio de ver algo temoroso em seu fim.

No fim, deu quase na mesma impressão.

Criativo!