À conversa com um amigo, falava da inexistência do conceito de culpa em alguns países asiáticos, nomeadamente na China, Coreia e Japão. Ele explicou-me que naqueles países as pessoas, ao realizarem uma determinada acção ou crime, reconheciam de antemão que podiam ser penalizadas e aceitavam as consequências dos seus actos. Daí não existir culpa e, evidentemente, culpados.
Escrevo isto porque foi a primeira coisa que me veio à cabeça após o acidente na praia Maria Luísa.
Em Portugal não se procuram causas, não se procuram vítimas, não se procuram resoluções para os problemas. Aqui, em primeiro lugar, procuram-se culpados.
Após a queda dos rochedos na praia, as primeiras notícias que ouvi falavam da procura dos responsáveis. "Quem teria sido responsável pela queda das rochas?", passou a ser o cerne da questão.
Será realmente tão importante, neste caso, a procura de responsáveis? Obviamente que existem entidades responsáveis pela pesquisa de pontos de perigo na costa, mas será exequível a permanente realização de peritagens às centenas ou milhares de Km de falésias existentes? Será possível uma resposta mais rápida do que aquela que foi dada? Será necessária mais informação aos banhistas do que aquela que figura em placas de aviso de perigo?
O que mais se poderá fazer para a prevenção destes acidentes? Será que a condenação de pessoas, que não fazem mais porque não podem, é justa? Vamos culpar a natureza e Deus? Vamos culpar a falta de educação cívica das pessoas?
Agora a pergunta que para mim mais sentido faz: é necessário encontrar-se culpados para os punir ou para nos sentirmos melhor?
Se vamos culpar alguém, ou alguma coisa, culpemos centenas de milhares de anos de erosão natural da costa, à força da gravidade que levou as pedras ao chão, às rochas com peso a mais e, já agora, a inconsciência das pessoas que não sabem reconhecer que correm perigo ao permanecer por baixo de uma arriba malabarista.
Agora, nos dias que se seguem à tragédia, é ver, diariamente, pessoas tentando explicar o sucedido, prometendo maior rigor nas vistorias, demolindo fanecos, reajustando calendários de trabalho, prometendo trinta por uma linha, como se assumissem que realmente foram responsáveis pelo sucedido. Por outro lado, vêem-se jornalistas de opinião pedindo a cabeça de fulano e sicrano numa típica tentativa de homicídio político; exigindo responsabilidades imediatas às instâncias públicas, como se tivessem esse direito.
Com estas linhas não venho dizer que não se devem apurar responsabilidades, mas que esta procura dever ser feita após profunda análise de todas as contingências do caso. Penso que a sede por culpados tolda a capacidade de raciocínio das pessoas, mas infelizmente é o que alimenta uma grande parte da imprensa (é interessante a pesquisa por notícias no google com base nas palavras Maria Luísa).
Às vítimas RIP e que possam servir de, dura, lição aos restantes...
E por falar em guilty, aqui vai um "guilty pleasure":
6 comentários:
muhaha..(em relação ao comentário que fizeste lá no blog...podes sempre tentar adivinhar o quê, o como e o onde...ou pedir a opinião de um amigo, a ajuda do público, sei lá..lol)
Só uma coisa, a erosão e o desgaste tem muitas vezes que ver com uma construção criminosa que foi foita em cima das arribas da praia. Algo que era previsivel, por todos os assassinatos ao ambiente que tem vindo a ser feitos.
Forte, concordo, a imagem dos relvados mesmo junto àquelas arribas na praia da Maria Luísa vêem-se por todo o Algarve. Até a casa do Mário Soares está construída junto a uma...
Mas o que queria dizer, com este post,é que nem sempre existem culpados, as coisas simplesmente acontecem.
Se caísse um meteoro neste planeta e, por ventura, algum jornalista (não quero generalizar ;)) sobrevivesse, procuraria logo um culpado: porque caiu, quem não avisou, quem não programou o pós-meteoro, etc, etc...
nota o muhaha é, logicamente, em relação ao comentário que fizeste no blog e não ao texto sério que aqui escreveste e sobre o qual não vou emitir opinião, porque de momento me sinto sem opinião alguma em relação a coisas inteligentes escritas por outrém...
pois eu acho que tens toda a razão, e irrita-me um bocado que nestas alturas sejamos todos umas criancinhas irresponsáveis cujas desgraças que se abatem sobre nós são sempre culpa do pai (=estado)
obrigada por me permitires este desabafo
beijos
Inconstante, bem-vinda a esta humilde casa. Podes desabafar à vontade, o estado não pode ser omnipresente nem omnisciente, algumas destas situações devem caber a nós.
Enviar um comentário